Sunday, January 28, 2007

Sim, Não, Talvez, Obrigado, Sff...

Tenho reparado ultimamente no quão educada tem sido esta campanha eleitoral. Frases como "Não, obrigada" ou "Sim, sff!", têm estado contantemente presentes nas nossas vidas quotidianas. Quer seja no gigante outdoor junto à faculdade ou à estação, ou na televisão, rádio, blogs, ou até mesmo nos nicknames do messenger, estes educados pedidos ou respostas parecem já ter lugar cativo.

Resta saber se, caso o não ganhe, todos estes movimentos de "apoio à vida", "apoio à maternidade", etc. vão continuar a existir e a fazer qualquer coisa pela sociedade. Os movimentos que aceitam o aborto nos termos da actual lei e que são a favor da despenalização, mas contra a liberalização (consequente desta pergunta e da futura lei), como é o caso do movimento "Assim, não" (www.assimnao.org), fundado pelo Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, podem até ter toda a razão e estarem cheios de ideias de futuros projectos de leis (diferentes desta), mas será que, caso dia 11 ganhe o não, vão mesmo fazer alguma coisa?

Será correcto apoiar esta liberalização? Não concordo que os abortos venham a ser feitos em hospitais públicos, passando à frente de pessoas que estão há anos à espera para uma cirurgia importante. Rui Castro diz, "Que raio de política de saúde é esta que sobrecarrega o já debilitado sistema de saúde nacional, favorecendo práticas como o aborto, o qual, como se sabe, não visa debelar qualquer doença?"
Será que todos os portugueses devem pagar pela irresponsabilidade e estupidez de alguns? Até há mesmo um slogan de uma campanha de um dos movimentos pelo sim que diz: As mulheres decidem. A Sociedade respeita. O Estado garante.”. Isto é escandaloso porque, no fundo, nos dias de hoje, com a deversidade de métodos contraceptivos eficazes, só engravida quem quer.

No dia 12 de Junho de 2006, foi publicado no Diário da República a Portaria n.º 567/2006, que aprova as tabelas de preços a praticar pelo Serviço Nacional de Saúde e que, estabelece na página 4195 os preços dos abortos no SNS:
- 829,91 euros, para o aborto sem dilatação e curetagem e
- 1074,45 euros, para o aborto com dilatação e curetagem, curetagem de aspiração ou histeroctomia.



Será correcto liberalizar o aborto, sabendo que é sempre uma circunstância traumática na vida de uma mulher (mesmo que o faça de livre vontade)? Porque razão não existe uma eficaz organização financiada pelo Estado, que apoie as mulheres desesperadas e que facilite os burocráticos processos de adopção? É horrível pensar que ao mesmo tempo que uma série de mulheres quer matar os seus filhos, existem milhares de casais que ou por não conseguirem engravidar, ou mesmo porque querem fazer bem a alguém, querem adoptar uma criança e estão anos à espera, totalmente envoltos em burocracia.

Uma importante questão é, irá o Estado, mais concretamente o Ministério da Saúde, gastar as verbas que iria gastar caso ganhasse o sim, no apoio às mulheres grávidas em desespero ou às crianças à espera de pais adoptivos, caso ganhe o não?

Mafalda Miranda Barbosa diz, "(...) [os defensores do sim] Sustentam, noutra linha de pensamento não menos falaciosa, que a vitória do sim é essencial para acabar com a humilhação dos julgamentos. Pergunto eu, novamente com preocupações temporais, o que acontecerá se a mulher apenas descobrir a gravidez depois das 10 semanas de gestação?"

Luísa Castel-Branco, diz que é a favor da despenalização do aborto mas que vai votar no não. Disse uma coisa que eu concordei totalmente: "encarar o aborto como um método contraceptivo é um crime". E no seguimento do seu pensamento, Assunção Cristas diz, "(...) o que se pretende é liberalizar totalmente até às 10 semanas a prática do aborto. De modo que a decisão sobre a maternidade já não precisa de ser tomada antes da gravidez. Garantidamente, se o “sim” ganhar, a mulher tem um prazo adicional de 10 semanas para ver se quer mesmo ou não aquele filho. A gravidez passa a funcionar como uma interpelação admonitória à qual se segue a resolução ou a opção pelo cumprimento. E, já agora, não se interrompe nada. Termina-se a gravidez."

"Sobra uma única coisa que está de facto em discussão: às dez semanas há ou não uma Vida? Há. É um facto, não é uma opinião. Há uma Vida com dez semanas – que faz caretas, tem dentes de leite, impressões digitais e um coração a bater - a que só falta nascer e crescer. A pergunta que agora se faz é escolher se a deixamos nascer, ou se deixamos que a Lei diga que pode ser abortada, se a mãe quiser. Seja por que razão for". Inês Teotónio Pereira

A pergunta está mal feita e remete para a partidarização do referendo pois, neste momento, votar sim, é aprovar a lei do PS. Por isso, provavelmente os resultados do referendo não vão reflectir a verdadeira vontade dos portugueses (por exemplo, o acima referido movimento "Assim, não", que não é a favor da despenalização, mas contra a liberalização).

Devo acrescentar, que este texto, esta reflexão, foi escrita enquanto eu, ainda em dúvida quanto ao referendo, decidi ir pesquisar sobre o assunto e, como é perceptível, acabei por rever os meus princípios no movimento "Assim, não".

Para que conste:
"62% dos abortos realizados em países europeus com legislação semelhante à pretendida em Portugal, são realizados por mulheres com rendimentos familiares superiores a 65.000 euros por ano.

6% dos abortos realizados em países europeus com legislação semelhante à pretendida em Portugal, são realizados por mulheres com rendimentos familiares inferiores a 7000 euros.

Em todo o mundo, o aborto sem invocar qualquer razão é permitido em 22 de um total de 193 países.

A pílula do dia seguinte é comercializada em Portugal desde 1999, sem necessidade de receita médica. É dispensada gratuitamente em centros de saúde desde 1 de Dezembro de 2005.


Não há mulheres detidas pelo crime de aborto em Portugal.

Em 2005 realizaram-se 906 abortos legais em Portugal.

Em 2005 houve 73 casos, e não milhares, de mulheres atendidas na sequência de abortos clandestinos.


Em 2005, a média de filhos por casal foi de 1,5, tendo-se registado apenas 109.000 nascimentos, permanecendo abaixo do nível de renovação das gerações (2,1).

Em 2006, a Alemanha aprovou um incentivo à natalidade de 25 mil euros por cada nascimento."

3 comments:

Concha said...

Tou orgulhosa, sim senhora senhor Francisco! ;)

Anonymous said...

Francisco!
Ta bom o texto...so uma cena, o marcelo rebelo de sousa e o seu movimento nao é a favor do aborto, Nunca! ele diz q concorda q as mulheres n devem ser presas(é a favor da despenalização) mas o q esta por trás desta pergunta é mt mais q isso e tu explicaste mt melhor!!
É uma chatice tar confuso...mas eu acho q ja tas a ficar mais inclinado pa um lado...:P LOL
Beijinhos:)

butterfly said...

Francisco, como deves ter percebido fui uma apoiante do SIM durante toda a fase antecedente ao referendo. Não quer dizer que não me tenha questionado e voltado a questionar vezes sem conta sobre o assunto. Como mulher, existe sempre uma possibilidade de um dia passar por uma situação de decisão, e SE um dia isso se pusesse em questão. Continua a ser uma questão cada vez mais complicada para mim, pessoalmente.
Embora o referendo já tenha passado, acho importante continuar a discutir este assunto tão controverso, porque, na sociedade em que vivemos, vai demorar algum tempo até a mulher poder falar abertamente sobre este assunto, vai ser difícil as medidas exigidas serem proveitosamente implementadas e vai ainda ser mais difícil as questões de descriminalização da mulher em muitos círculos sociais.
Então cá vai a informação que pesquisei sobre este assunto a consequente opinião.
A minha opinião sobre a posição do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa quanto a este referendo foi bastante bem definida quando coloquei o clip da dramatização do gato fedorento no blog da turma.
Achas hipócrita pagar pelos erros dos outros? Então e perder tempo e dinheiro a “arranjar” abortos mal feitos. Então e morrer por causa de um aborto desses? Não achas menos hipócrita salvar uma vida? Morreram mulheres na sequência de abortos ilegais, muitas vezes à distância de um telefonema de distância que por questões legais foi proibido.
Um erro? Existem muitas crianças de 14 anos (sim, aos olhos da lei são crianças) que são violadas (com ou sem consentimento é violação nesta idade) por adultos não tão jovens. Existem crianças que dão à luz outras crianças, que se vêm presas a uma realidade a que não podem fugir, a uma vida que muitas vezes leva à prostituição e não são poucas essas vezes. Não falo de cor nem enfatizo o assunto porque há muita informação que preferia desconhecer mas, basta falar com uma assistente social de um bairro desfavorecido para perceber que a realidade no que toca a este assunto normalmente é bem pior do que aquela que imaginamos.
Está provado cientificamente que nenhum método anticonceptivo é 100% fiável, aliás o método mais utilizado, o preservativo, tem apenas 66% de hipóteses de ser eficaz. Assim, será que consegues imaginar uma pílula tomada religiosamente que de repente não surte efeito apenas porque se esteve doente com diarreia ou vómitos, onde está a pílula do dia seguinte se só quando o período não chega se percebe o que aconteceu? A abstenção é o único método 100% seguro. A média de casamento em Portugal situa-se por volta dos 28 anos. O que interessa de repente, não é o mundo idílico que se poderia construir a partir de pressupostos mas a realidade em si, e o conhecimento que muitos não têm dela.
O preço de que falas, é em tudo semelhante ao preço praticado no negócio do aborto ilegal, além disso existem subsídios e o direito a uma medicina segura e gratuita para todos os portugueses que dela reclamem. Acabar definitivamente com o aborto feito em casas não autorizadas, não me parece mas reduzi-lo ao máximo. Acredito muito no cuidado que as mulheres têm ao expor o seu corpo dessa maneira.
Nenhum mulher faz um aborto de consciência leve basta um título de um livro para nos pôr a pensar “Crime ou Castigo”…
Quanto à adopção, não existe falta de crianças desfavorecidas a viver em condições deploráveis tanto físicas como emocionais, o verdadeiro problema como tu próprio apontaste é a burocracia.
Caso o Não tivesse ganho este governo estaria de mãos atadas quanto a este assunto, não teria autoridade para agir nesta matéria, uma vez que seria extremamente pressionado para que a actual lei mudasse, para que até as mulheres violadas tivessem que levar a gravidez até ao fim. E tu? O que achas, uma mulher vítima de violação tem que ser obrigada a carregar com algo que não é dela durante 9 meses? Não deixando passar o trauma e se fosse com um familiar teu, uma filha, uma irmã, uma mãe…
Neste momento existe, ou vai existir, o direito à escolha. Quem por principio achar que uma vida às dez semanas não deve ser interrompida ou terminada, também deve ser contra a fertilização in vitro e, até mesmo contra a finalização dessa vida em casos de violação, demência da mulher ou má-formação do feto.
Mas existe a escolha e a pergunta não era, se tu eras capaz de fazer ou apoiar alguém que fizesse um aborto, mas de dar a possibilidade que quem o queira fazer de livre vontade, o possa efectuar em condições higiénicas e medicamente controladas. Algo que vai acontecer, que acontece (!) não é nosso dever providenciar condições para que a interrupção seja feita nas melhores condições medicamente possível, de modo a salvaguardamos a vida que vive cá fora, que existe em vez, da morte de dois seres?
Todos os dados que foram revelados foram relançados depois do resultado do referendo, todos eles são analisados do modo que nos convém ao discurso, não é a realidade que vês na rua, nos bairros, no autocarro, tão mais importante que números?
Morreram mulheres vítimas de abortos, nem que tenha sido uma, eu também sou pela vida.
Por fim, o que é pior ser detida ou ser julgada?